Se o debate já vinha com ares de azul contra vermelho, ou republicanos contra democratas, a defesa do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em prol de regras que venham a garantir neutralidade de rede escancarou as porteiras da partidarização. Embora a surpresa nas declarações esteja mais no tom que no conteúdo, parece ter dado a senha para uma enxurrada de analogias ainda mais esdrúxulas do que as vistas no Brasil quando da discussão sobre o Marco Civil da Internet.
A largada foi dada pelo senador Republicano Ted Cruz, do Texas, que tachou a neutralidade de rede como “Obamacare para a Internet”, associando as propostas do presidente americano para a rede com a reforma do sistema de saúde dos EUA – uma guerra política que consumiu o primeiro mandato de Obama.
Era só o começo. Diferentes analistas da Fox News – canal fortemente identificado com o ideário Republicano em sua versão Tea Party – alegaram que a neutralidade de rede equivaleria a “tirar a escolha de compradores e vendedores para fora do mercado”. Ou, ainda, que as propostas significariam a oferta de “uma velocidade única para todos, um preço para todos”.
Esse tipo de lógica é até familiar aos brasileiros. Afinal, durante a tramitação do Marco Civil, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que acabou travestido de principal opositor ao projeto, usava argumento parecido. Segundo Cunha, a neutralidade era “intervencionismo na infraestrutura brasileira”, que impediria a oferta de pacotes diferenciados, resultando na “comunização da Internet”.
Nem Cunha, porém, chegou perto das críticas de que a reclassificação dos provedores como empresas de telecom “levaria os Estados Unidos para perigosamente perto do modelo chinês onde a Internet é estatal”. Houve até quem arriscou que “o simbolismo na declaração ter sido divulgada enquanto o presidente Obama está na China não poderia ser mais Orwelliano”.
Em meio a repercussão, o que chamou a atenção foi a recepção fria da FCC aos comentários do presidente americano. O presidente da agência, Tom Wheeler, que deve o cargo a Obama, respondeu que “como uma agência reguladora independente, vamos incorporar a sugestão do presidente aos registros da consulta pública sobre Internet aberta”. “Agradecemos os comentários sobre como usar o Título II da Lei de Comunicações”, concluiu.
É certo que, como só ocorre nos EUA, a agência reguladora de telecom é claramente dividida entre Democratas e Republicanos. Na prática, mais do que ameaças de processos judiciais das operadoras americanas contra as eventuais medidas da agência, parece ser no Congresso, agora com as duas casas nas mãos da oposição Republicana, que a questão da neutralidade de rede acabará sendo decidida.
Site: Convergência Digital
Data: 11/11/14
Hora: 16h40
Seção: Internet
Autor: Luís Osvaldo Grossmann
Link: http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=38378&sid=4#.VGJljPnF92E