
Nova diretriz da empresa exige justificativas para contratação de pessoas em vez de inteligência artificial.
Um memorando interno vazado do Shopify tem agitado os bastidores da indústria de tecnologia e provocado um misto de surpresa, inquietação e reflexão. No documento, o CEO da empresa, Tobi Lutke, afirma que, a partir de agora, toda nova vaga aberta na empresa deverá ser justificada com base na incapacidade da inteligência artificial (IA) de realizá-la.
Mais do que uma provocação, a exigência foi recebida como um sinal claro de mudança de paradigma. Para muitos, o memorando representa o primeiro grande marco público da IA sendo tratada como um membro efetivo da equipe — e não apenas como ferramenta de apoio.
“Antes de pedir por novos funcionários e recursos, os times devem demonstrar por que esse trabalho não pode ser feito usando IA. Como essa área se pareceria se agentes autônomos já fossem parte do time? Essa questão pode levar a discussões e projetos divertidos”, escreveu Lutke no comunicado.
Além disso, a empresa adotará o uso de agentes autônomos de IA como obrigatórios nas equipes, sendo utilizados não apenas para execução de tarefas, mas também em avaliações de desempenho e decisões sobre promoções. A IA, nesse contexto, passa a integrar diretamente os processos decisórios e estratégicos da companhia.
A maior transformação da era pós-pandemia? – Apesar de o CEO não anunciar novos cortes de pessoal neste momento, o tom da mensagem é claro: a IA deixará de ser apenas uma tendência para se tornar pilar estrutural no modelo operacional da Shopify.
“A mudança mais rápida que já vimos na forma como se trabalha”, definiu Lutke.
Desde 2023, a empresa já havia demitido cerca de 20% do seu quadro de funcionários e, silenciosamente, reduziu também parte da equipe de atendimento no início de 2025. A medida coloca o Shopify ao lado de outras grandes empresas que vêm adotando automação e inteligência artificial como substitutas diretas de postos de trabalho.
Um movimento que já está em curso
Outras gigantes do setor também caminham na mesma direção, ainda que de maneira menos explícita:
- Klarna: cortou 2 mil funcionários entre 2022 e 2024 e já conta com 700 agentes de IA no atendimento;
- Duolingo: demitiu 10% da equipe de tradução;
- Meta: anunciou corte de 21 mil postos de trabalho para “otimização operacional”;
- Salesforce: desligou 700 funcionários em 2024;
- Google: realizou duas rodadas de demissões com foco em funções passíveis de automação.
A tendência é clara: a IA está deixando de ser uma vantagem competitiva e se tornando critério básico de sobrevivência em muitas empresas. E mais do que isso, está redefinindo o que significa ser produtivo, necessário ou até mesmo empregável.
Embora o cenário levante preocupações, especialmente sobre o futuro do emprego humano, os dados do Fórum Econômico Mundial apontam para uma transição mais equilibrada do que se imagina.
Segundo o relatório mais recente da entidade, até 2030 haverá a perda de 92 milhões de postos de trabalho, mas também a criação de 170 milhões de novas funções com o suporte da tecnologia. A chave, segundo especialistas, está na requalificação e adaptação rápida da força de trabalho.
A grande pergunta que o memorando do Shopify joga sobre a mesa é: estamos preparados para tratar a inteligência artificial como colega de trabalho — ou mesmo como chefe?
Mais do que uma crise, o momento pode representar uma mudança estrutural na forma como pensamos trabalho, colaboração e inteligência. O futuro do trabalho não será apenas digital — será cognitivo, automatizado e, acima de tudo, disputado.
Texto: Redação TI Rio