RIO – Para se tornar realmente uma economia com foco no mundo digital, o Brasil precisa ter uma política industrial abrangente para o setor e criar processos para que a academia e as empresas andem de mãos dadas, defenderam especialistas esta semana no seminário Economia Criativa Digital, no Rio Info. Segundo Márcio Girão, presidente da Federação Nacional das Empresas de Informática (Fenainfo), esse é um caminho essencial.
— Não critico o atual governo, mas todos os governos, no sentido de que o país ainda erra profundamente aí… Nos falta método. As empresas de fora não são obrigadas a fazer uma patente aqui, embora invistam em pesquisa, como manda a lei, usando nossos quadros — afirmou Girão.
Para o executivo, no futuro o hardware seremos nós, os seres humanos, por isso é urgente investir em conteúdo, acima de tudo. A posição do professor Bruno Feijó, do CTC/Departamento de Informática da PUC-Rio, é semelhante.
— O casamento da academia com a indústria ainda está muito longe, e isso não pode passar por apenas um ministério: é preciso abraçar uma política para o setor de tecnologia, investindo fortemente no país e gerando conteúdo pesadamente — afirmou. — Ainda há um apagão na mão de obra em TI.
Feijó exemplificou a dificuldade da travessia academia-indústria contando que certa feita investiu num aluno que criou um game que chegou aos Top 100 do iTunes, da Apple:
— O jogo ficou até em 25º lugar em Taiwan… Isso atraiu investidores internacionais, que acabaram me levando a equipe inteira — lamentou.
O governo, por sua vez, fez questão de ressaltar suas iniciativas no seminário. O economista Thales Marçal Vieira Netto, do Ministério das Comunicações, mencionou, entre outras coisas, a cota de cinco aplicativos nacionais até outubro para que os smartphones produzidos no país tenham isenção de Pis/Cofins; eles devem chegar a 50 até dezembro de 2014.
— Esse número de 50 apps foi negociado com os próprios fabricantes. Eles queriam menos, é verdade, mas chegamos a essa quantidade — esclareceu Vieira Netto. — Nossa intenção com a medida é voltar justamente os holofotes para o conteúdo nacional, para os apps produzidos aqui.
Vieira Netto diz que o número de apps pode até ser maior que 50 no futuro, caso a isenção fiscal seja estendida além de 2015. E explicou que o governo ainda estuda o que seriam os apps de utilidade pública mencionados na portaria original sobre a exigência:
— Estamos vendo um cronograma, mas acredito que sejam apps em várias áreas. Por exemplo, um controle de vacinas, algo de cultura… Mas ainda não há nada definido, realmente — disse o economista.
A diretora da Agência Nacional do Cinema (Ancine), Vera Zaverucha, mencionou as cotas de produção nacional para a televisão por assinatura e revelou planos para investimento em plataformas digitais com os recursos obtidos a partir da lei 12.485, de 2011, que também permitiu às teles entrarem no setor.
— O estímulo ao setor audiovisual incluirá videojogos e mídias móveis — contou Vera. — Até o final da década pretendemos ter pelo menos 20 videojogos baseados em filmes e obras seriadas, além de conteúdo interativo.
A interatividade, po sinal, foi tema abordado amplamente no seminário. André Nunes, chefe do Departamento de Tecnologias da Informação e Serviços da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), discorreu sobre vários modelos de interação (e negócios) ligados à televisão —segunda tela, Ginga, smart TVs e realidade aumentada, entre outros.
— A Finep está interessada em financiar projetos em todas essas diferentes tecnologias, inclusive dentro do âmbito da metodologia Finep 30 dias, que reduz para um mês o tempo de análise das propostas — afirmou Nunes.
Especialistas como Gil Giardelli, da Gaia Creative, versado em cultura digital, e Gabriela Mafort, do Lab.Digital-RJ, apontam para um futuro em que a convergência midiática passará a ser condição fundamental para evoluirmos. Giardelli lembra que, só no ano que vem, compartilharemos 133 vezes mais coisas on-line do que nos últimos 30 anos.
— Sai a sociedade da informação, entra a do conhecimento — diz. — Vivemos uma crise universal de desajuste coletivo, e muitas das empresas que eram autocêntricas no passado desapareceram ou foram adquiridas por outras: hoje o conceito fundamental de uma empresa é estar em rede.
Para Gabriela, jornalista especializada em conteúdos digitais, a imersão interativa é o futuro da mídia.
— É o que eu chamo de “a terceira coluna”: num roteiro tradicional, há uma coluna para o texto e outra para as indicações de áudio e vídeo. Mas hoje tem que haver uma terceira coluna, para indicar a interatividade — define. — Hoje, todo jornalista também tem que ser um pouco “tecnologista”, pois a geração Y já pensa no hiperlink.
Site: O Globo
Data: 19/09/2013
Hora: 13h53
Seção: Tecnologia
Foto: Divulgação
Autor: André Machado
Link: http://oglobo.globo.com/tecnologia/rio-info-brasil-precisa-de-politica-mais-abrangente-voltada-para-ti-afirmam-especialistas-10035835