No dia seguinte a aprovação do texto do relator Alessandro Molon, do PT/RJ, para o Marco Civil da Internet – com uma surpreendente unanimidade após dois anos de muita batalha e de semanas duras com embates entre partidos da base aliada- o clima no mercado é de expectativa positiva. A Proteste – Associação de Consumidores, por exemplo, por meio de nota oficial, comemora a decisão. “Trata-se de uma grande conquista dos consumidores, que garante a democracia, a neutralidade das redes e a liberdade de expressão na Internet”.
Segundo ainda a entidade, “da forma como está disposto o texto do PL, provedores que ofereçam planos de internet para um determinado tipo de serviço não serão mais autorizados, e isso facilitará a vida dos consumidores de um modo geral. Hoje ocorre, por exemplo, de um plano ser oferecido apenas para acessar e-mail, outro só para englobar serviços de voz e acesso a vídeos e assim por diante. O Marco Civil é central para a democratização das comunicações no Brasil”.
Mas há pontos de discussões. E, claro, a neutralidade de rede está à mesa. Para o advogado e integrante do Instituto Coaliza, Walter Capanema, a redação do artigo 9º, abre brecha para colocar o acordo firmado entre a Netflix e a Comcast como uma exceção a ser regulamentada pela presidência da República.”
A questão é: o Executivo vai ouvir a Anatel e o Comitê Gestor da Internet, segundo o Marco Civil. Vamos entrar numa esfera política. E se não houver consenso? O Executivo dará a palavra final, mesmo não sendo especialista no assunto, apesar das posições da Anatel e do Comitê Gestor? Predominará a posição do órgão regulador? Nós sabemos que a Anatel tem tomado decisões orientadas ao mercado”, sustenta.
Já para o advogado e diretor superintendente do Instituto Avanzi, ONG de defesa dos direitos do consumidor de telecomunicações, Dane Avazzi, as regras como estão colocadas garantem a neutralidade de rede e impedem, sim, que uma das provedoras de telecomunicações do país eche acordos de priorização de tráfego como o da Comcast/Netflix.
“Não enxergo abertura para esse tipo de negociação no texto aprovado para o Marco Civil”, pondera. Mas segundo Avazzi, boas intenções à parte, o Marco Civil não trará mudanças para o usuário da Internet no Brasil. “Em termos práticos, a internet vai ficar mais barata? Não.
Continuará existindo vários tipos de pacotes que vão definir a qualidade que o consumidor terá. Se a lei for sancionada como está pode impedir que no futuro seja cobra pelo acesso por tipo de conteúdo, mas com a obrigação da guarda de logs, determinada na versão aprovada, esse custo pode ficar mais caro”, sinaliza o advogado.
A neutralidade é ponto controverso até para os provedores Internet. A Associação Brasileira de Provedores de Internet e Telecomunicações (ABRINT), por meio de comunicado, pondera que a aprovação do Marco Civil foi um avanço, mas sustenta que a manutenção do conceito da neutralidade de rede é motivo de preocupação.
“A internet de hoje ainda é infinitamente incipiente diante dos avanços que a rede vai experimentar em alguns anos. A lei vai garantir que todos tenham acesso igualitário a este universo, o que é essencial para a valorização da cidadania e para a manutenção de negócios de internet”, observa Basílio Perez, presidente da ABRINT.
Perez considera que a definição da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) e do Comitê Geral da Internet no Brasil (CGI.br) como fóruns para dirimir conflitos em relação ao uso da internet confere aos órgãos a responsabilidade de refletir os anseios da sociedade nas decisões que vierem a ser tomadas.
“E, apesar de a internet não ser telecomunicação, carece desta rede para operar e é relevante o envolvimento delas nessa questão”, afirma o executivo. No comunicado enviado ao mercado, o SindiTelebrasil, representante das teles, não toca no tema neutralidade, sustenta apenas que a redação aprovada mantém a estratégia atual de negócios – que prevê a venda de pacotes diferenciados, de acordo com os serviços ofertados.
Já o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), comemorou a manutenção no texto final do princípio da neutralidade de rede, que garante o tráfego não discriminatório de pacotes de dados na internet, impedindo que as empresas de telecomunicações dêem prioridade ou degradem determinados conteúdos, serviços e aplicações online segundo seus interesses.
“Apesar da pressão contrária desse setor, a neutralidade foi assegurada no texto final que segue para o Senado, com a defesa de que todos possam navegar na internet sem bloqueios, independentemente de ser acesso a textos, vídeos, e-mails, ou mesmo no caso de ser um produtor desse conteúdo, sem uma cobrança diferenciada por cada perfil de internauta”.
*Com Assessoria da ProTeste, Abrint e IDEC
Site: Convergência Digital
Data: 26/03/2014
Hora: 16h33
Seção: Internet
Autor: Ana Paula Lobo
Link: http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=36318&sid=4#.UzSDSKjMSrE