O Rio de Janeiro tem vocação natural para ser um importante polo de desenvolvimento de software e serviços de TI e concentra grande parte das empresas no setor no país. Mas, a despeito dessa estrutura favorável, o setor enfrenta uma concorrência desigual com outros centros. Essa realidade, provocada pela falta de políticas públicas de incentivo, e suas consequências, esteve em pauta durante o tradicional jantar anual das empresas de informática, realizado em 5 de dezembro, no Clube Ginástico Português, Centro do Rio, pelo TI Rio (Sindicato das Empresas de Informática do Rio de Janeiro).
“O Rio de Janeiro concentra boa parte das empresas de TI, mas não tem recebido a atenção devida por parte dos sucessivos governos em relação a políticas públicas de incentivo”, afirma Benito Paret, presidente do TI Rio. A entidade apresentou estudo elaborado com base nos dados da Rais e do Caged, que mostra que a ausência de condições que favoreçam a concorrência equilibrada com outros estados tem levado o Rio a perder empresas e empregos na área.
Os dados da pesquisa refletem esta realidade. No período de 2007 a 2015, por exemplo, o número de postos de trabalho para profissionais do setor no Brasil cresceu 9,4%; no estado, o índice ficou em 6,4%. Abaixo também dos 8,6% registrados em São Paulo.
Paret lembra, por exemplo, das promessas de redução da alíquota do Imposto Sobre Serviço (ISS) no município do Rio de Janeiro. Em 2007 uma primeira proposta neste sentido chegou à Câmara dos Vereadores. Em 2009, foi substituida por outra, mas nenhuma foi à votação. Em um vídeo exibido durante o jantar, Paret destacou as dificuldades do setor e apontou possíveis soluções para retomar o crescimento.
A mesma opinião tem o professor e deputado federal Celso Pansera, presidente do Conselho de administração da Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex), que destacou a qualificação do Rio na área de TI. “Aqui estão concentradas pesquisas acadêmicas relevantes, laboratórios de desenvolvimento de tecnologia, profissionais capacitados e empresas atuantes de médio e grande portes.”
A Softex foi homenageada na noite do jantar por seu papel relevante no fortalecimento na Tecnologia da Informação no País, com ênfase na qualidade, disseminação de padrões e apoio à internacionalização das empresas nacionais de software e serviços de TI.
Vocação real
Para o presidente da Associação Comercial do Estado do Rio de Janeiro (AC-Rio), Paulo Protásio, a falta de políticas públicas de incentivo à TI é lamentável, porque o Rio teria uma vocação real pra aser uma “smart city”. “O Centro de Controle da Prefeitura é todo informatizado, aqui há vários centros de pesquisa e uma frente marítma forte, que demandam soluções de TI. Porém, estamos perdendo posição no mercado”, observou. Na avaliação de Franklin Coelho, secretário Municipal de Ciência e Tecnologia e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), essa ausência de políticas públicas é fruto da desorganização do próprio do setor de TI no País, pois faltam informações que deem subsídios para a construção dessas políticas.
“Nós não produzimos informações e ainda enfrentamos a falta de transparência. Esta não é uma questão apenas do setor de TI, mas do País de modo geral. Por isso, a iniciativa do TI Rio ao elaborar este estudo é tão importante. Um panorama do mercado é fundamental para que possamos pensar estratégias de crescimento para a área”, pontuou Franklin.
O problema é ainda maior para as pequenas empresas, na opinião de Cezar Vasques, superintendente do Sebrae RJ. “A atual estrutura de benefícios privilegia as médias e grandes empresas do setor, mas não as pequenas, que acabam não tendo condições de se desenvolver.
Falsa economia
Coordenador do estudo que traça o perfil do mercado de TI no Rio e no Brasil, o professor Luiz Carlos Sá de Carvalho, que também é diretor do TI Rio, destacou o que ele classifica como “falsa economia”: a redução de pessoal e as admissões em número menor do que as demissões e/ou a contratação de substitutos por salários menores.
“Isso leva algumas empresas a supor que estão economizando. No entanto, é preciso considerar todos os custos de demissões (trabalhistas e operacionais), de novas contratações (treinamento, adaptação à empresa, erros de seleção etc.), além da perda de capital intelectual e de competitividade”, enumera.
Vale destacar também que a posição desigual do Rio de Janeiro em relação a outros estados traz outras desvantagens para o estado e o País, como a migração de mão de obra qualificada, redução de arrecadação de impostos, perda de emprego e renda e diminuição da capacidade técnica global. “Portanto, não é apenas uma questão de cada empresa individualmente, embora estas, muitas vezes, não tenham alternativas.”
A apresentação do estudo, segundo Luiz Carlos Sá, é apenas o início de um processo de interpretação, que pode trazer uma série de outros cruzamentos de dados reveladores. “É o que pretendemos fazer, Estes dados se desdobram em vários outros, necessários para dar um panorama mais detalhado para o empresário e o trabalhador”, completou.
O Evento contou com a participação de parceiros, empresas associadas e autoridades.
Números da Pesquisa mostram retração
O estudo elaborado pelo TI Rio mostra que nos primeiros nove meses deste ano a retração foi geral. O Rio perdeu 8% dos postos de trabalho em TI; São Paulo 2% e o Brasil 1%. O número de empresas de TI também teve um crescimento baixo no estado (4,7%), Brasil (6,5%), São Paulo (6,9%). Estes dados de 2016 foram antecipados pelo comportamento do mercado de trabalho no Rio de Janeiro, que já em 2015 apresentou uma queda de 4% no número de postos de trabalho, enquanto São Paulo e brasil naquele ano cresceram 1%.
Outro dado que mostra as desvantagens para as empresas do Rio é o número de assalariados no setor, que cresceu 8,4% em São Paulo; 7,9% no Brasil e 4,6% no Rio de Janeiro, no mesmo período. A pesquisa não considera os profissionais que são Microempreendedores Individuais(MEI).
Apesar de traçar um cenário de tração do setor, o estudo traz um dado positivo quando compara o valor das médias salariais dos profissionais especializados em TI que trabalham nas empresas do setor. O Rio lidera com crescimento percentual de 1%; seguido por São Paulo, com 0,9%. Brasil tem 1,6%.
O estudo indica ainda que, no Brasil, cerca de 405 mil profissionais de software e serviços trabalham em áreas de TI em empresas que têm outras atividades principais. Desses, quase 50mil estão no Rio de Janeiro. A melhor média salarial do setor está em São Paulo, com R$6.582.
Segundo a pesquisa, no Rio as atividades de alta complexidade têm concentrado a maior parte dos profissionais, sendo que a “consultoria em TI” é uma das que está em linha ascendente: 5.050 (2014) para 6.275 (2015).
Jornal: O Globo
Data: 13/12/2016
Caderno: Economia
Página: 21