O Brasil não deve contar tão cedo com uma lei sobre a proteção de dados pessoais. As controvérsias sobre o texto em discussão no Senado, o PLS 181/14, convenceram o relator a adiar uma proposta. E o texto do governo, um anteprojeto costurado há quatro anos, supostamente pronto, segue parado no Ministério da Justiça.
Nesta terça, uma dezena de convidados discutiram o tema no Senado Federal. Lá, o PLS 181/14 já contava até com posicionamento do relator, Aníbal Diniz (PT-AC), que recuou. “Temos muitos elementos para reestudar o projeto”, admitiu ele ao fim da reunião. Não surpreende. Embora muitos pontos de concordância tenham sido evidenciados, há problemas que levam a pedidos de “alteração substancial de todo o projeto”, como verbalizado pela Febraban.
Em geral, todos os convidados apontaram falhas na proposta. Desde a falta de clareza na definição do que são ‘dados pessoais’ – por exemplo, se o endereço IP entra (como proposto) ou não nessa definição. Pior ainda ficou a descrição do que seria o tratamento dos dados, afinal o ponto central de um projeto de lei que visa regular exatamente o uso das informações. Como explica a supervisora do Grupo de Ensino e Pesquisa em Inovação da FGV/SP, Mônica Steffen Rosina:
“Basicamente trata tudo como tratamento de dados. Se entendo o IP como dado e se tenho uma definição de tratamento que diz que tudo que é feito com aquele IP é tratamento, então tudo que se faz com o terminal que utilizo para acessar a Internet está sujeito à legislação. Em última instância, isso inviabiliza a oferta de determinados serviços para a população que hoje democratizam o acesso. Hoje temos e-mails gratuitos, buscas gratuitas, redes sociais que são gratuitas, e são gratuitas na medida em que parte do que ofereço em troca são dados.”
Esse é o equilíbrio que, ao julgar pelas críticas, parece ainda não ter sido encontrado em uma proposta legislativa. Todos os presentes defenderam a necessidade de uma legislação para a proteção de dados pessoais – especialmente porque o Brasil está atrasado. Cerca de 100 países já contam com leis para regular o uso de dados pessoais, questão que ganhou ainda mais evidência com a disseminação da Internet.
“A regulação é irreversível. Mas algumas questões são imprescindíveis de debate. Leis que tratam de tecnologia não podem conter definições técnicas, sob o risco de que essas definições fiquem obsoletas. Outro ponto, é que o consentimento é fundamental, mas será que internauta sabe o que está fazendo? Hoje não se lê. Quem não concorda com os termos simplesmente não usa. Felizmente, o Marco Civil já vai obrigar que termos de uso fiquem mais claros, mais objetivos”, afirmou o especialista em direito eletrônico e digital, Renato Opice Blum.
Além das ponderações terem levado ao recolhimento da proposta do relator, o senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) já pediu que uma proposta sua que também toca no tema (PLS 330/2013) seja apensada para tramitação conjunta – bem como outra sugestão, oriunda da CPI da Espionagem, que exige autorização judicial prévia para o acesso por autoridades e organismos internacionais a dados de brasileiros e empresas nacionais.
O coordenador-geral de Estudo e Monitoramento de Mercado da Secretaria Nacional do Consumidor, Danilo Doneda, principal autor do anteprojeto do governo para a proteção de dados pessoais, também esteve na reunião mas não se atreveu a dar pistas do destino da proposta. Depois do anúncio, em abril deste ano, de que o texto estaria pronto, nada mais se falou sobre ele. Na reunião desta terça, mal foi mencionado.
Site: Convergência Digital
Data: 02/12/14
Hora: 16h15
Seção: Internet
Autor:Luis Osvaldo Grossmann
Link: http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=38563&sid=4#.VH5MTtLF_fI