Benito Paret*
Poucos anos atrás a internet era de poucos e as preocupações políticas inexistentes. Se considerarmos que o projeto de Lei que trata do Marco Civil da Internet surgiu em 2007, quando foi apresentado o Projeto de Lei de Cibercrimes muito criticado pela sociedade e apelidado de “AI 5 Digital”, e acabou dando origem ao Projeto enviado pelo Executivo em 2009 e recém aprovado nas Casas Legislativas, depois de cinco anos de intensos debates.
Conseguir o consenso, nem que seja de forma bastante precária, dos interesses das empresas de TELECOM, Provedores, Governo e Sociedade Organizada foi um grande avanço.
A neutralidade da rede ficou de fora do documento final do NETmundial. O princípio de que não pode haver discriminação dos tipos de dados que trafegam na internet não foi incluído no acordo apresentado ao fim do encontro, que reuniu representantes de 80 países. Cerca de 900 pessoas, entre integrantes de governos, empresas, especialistas e militantes discutiram governança na internet durante dois dias.
As recomendações buscaram estabelecer princípios comuns e apontar um roteiro para o desenvolvimento da rede nos próximos anos. As discussões começaram a partir de um documento elaborado com contribuições de todos os setores envolvidos em 46 países. O texto foi então aberto para consulta pública durante o evento.
Os próximos passos ainda são muitos. Falta regulamentar a nova lei aprovada em pelo menos dois aspectos: as exceções à neutralidade de rede e o próprio artigo 15. que tratada Guarda de Registros de Acesso a Aplicações de Internet em ambiente controlado pelo prazo de seis meses. As organizações da sociedade civil esperam limitar a coleta massiva de dados dos usuários para um número mais restrito de empresas que sejam responsáveis por páginas ou serviços que, num dado período, tenha sido alvo de um grande número de denúncias de atividade suspeita ou ilegal. A continuação do debate sobre regulação da internet também se dará na reforma da lei de direitos autorais e na lei de proteção a dados pessoais. Nenhuma das duas teve sua tramitação iniciada no Parlamento.
A presença da neutralidade da rede no documento era defendida pelo governo brasileiro, mas ele foi derrotado por pressão dos Estados Unidos e da União Europeia com intensa participação das empresas de telecomunicações.
No âmbito internacional, o Marco Civil da Internet deve impulsionar, em diferentes países, legislações baseadas nos três pilares fundamentais: neutralidade de rede, liberdade de expressão e privacidade.
O processo de construção e aprovação do Marco Civil, que durou ao todo mais de sete anos, não termina agora, embora tenha sido de grande importância sua sanção pela Presidenta Dilma na abertura do NetMundial, e sem duvida entra para história como uma lei modelo para a regulação da internet em todo o mundo. Além dos desafios que estão colocados para o debate, novos mais surgirão. A importância que a internet ganhara nos próximos anos é indiscutível, e os conflitos dos variados interesses econômicos aumentaram o calor dos debates.
Mas a síntese que fica e que a sociedade civil, tem que se manter organizada para garantir seus direitos e evitar que os direitos decorrentes de uma internet livre e democrática sejam atropelados.
*Benito Paret é presidente do Sindicato das Empresas de Informática do Estado do Rio de Janeiro.
Jornal: O Globo
Data: 04/05/2014
Caderno: Opinião
Autor: Benito Paret
Página: 17