Complexo de vira-lata

Benito Paret

Já é hora de os brasileiros despojarem-se do complexo de vira-lata em relação a quase tudo o que se refira ao Brasil. Veja-se o exemplo de noticiário recente sobre a posição do país no ranking de patentes solicitadas à Organização Mundial de Propriedade Intelectual (Ompi). Classificou-se recentemente de tragédia nacional o fato de estarmos no 24º lugar, em 2009, e comparou-se o número de patentes solicitadas pelo Brasil ao de economias maduras e há muito estabilizadas. Mas não se atentou para a evolução do quadro divulgado pela entidade, nem para a comparação com os chamados países em desenvolvimento.

Claro que volume de patentes é indicativo de vitalidade de um país na área de ciência e tecnologia. Mas não é o único. Nem se pode afirmar que país fora dos primeiros lugares da lista não produza inovação. Mesmo que tenhamos ainda um longo caminho a percorrer, é importante frisar que entre 2005 e 2009 o Brasil aumentou em 83,7% o número de patentes solicitadas à Ompi. Passou de 270 pedidos, em 2005, para 496, em 2009.

Com isso, subiu três pontos na classificação geral, passando da 27ª para a 24ª posição. Não é pouco. No grupo dos Brics, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, somente nós e a China aumentamos o número de pedidos de patentes internacionais, de 2008 para 2009. É interessante observar, também, que entre os 15 primeiros do ranking, no mesmo período, somente cinco países cresceram: Japão (3,6%), Coreia do Sul (1,9%), a locomotiva chinesa (29,1%), França (1,3%) e Holanda (2,4%). Os demais caíram. Entre cinco grandes produtores de tecnologia, a queda superou dez por cento.

No plano interno, o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) registrou 124.660 solicitações de marcas depositadas em 2008. Deste total, 70% feitas por empresas nacionais. Somos um dos dez principais países do mundo em pedidos de marcas apresentadas. Em relação às patentes, o Brasil é líder de solicitações nacionais, na América Latina, com 26.232 registros em 2008. Estes números, faça-se justiça, decorrem, em parte significativa, da política de apoio à inovação conduzida pelo governo brasileiro nos últimos anos. 

São muitas as boas iniciativas adotadas para incentivar a inovação e promover a competitividade da economia brasileira de longo prazo. São medidas tributárias, regulatórias e de financiamento. E elas têm dado resultados mensuráveis.

O que o Brasil precisa, no estágio atual, é de inovação incremental, na definição schumpeteriana. Para Schumpeter, inovação é a introdução de um novo produto ou mudança qualitativa em produto existente; inovação de processo que seja novidade para uma indústria; abertura de um novo mercado; desenvolvimento de novas fontes de suprimento de matéria-prima; mudanças na organização industrial. E a maior parte dessas inovações não gera patente. Bom exemplo disso é a área de TI. Não há setor da economia que passe por mais ondas de destruições criativas e seja obrigado a inovar que a TI. A demanda por financiamento, nessa área, no Brasil, é prova disso. Chegou a R$ 5,2 bilhões o volume de projetos apresentado à Finep, em 2009, para um edital que destinava R$ 450 milhões de subvenção a vários segmentos estratégicos. 

Ainda temos muito que caminhar para nos equipararmos aos maiores produtores de tecnologia no mundo. Mas já é hora de deixar de lado o complexo de vira-lata.

*Benito Paret é presidente do Sindicato das Empresas de Informática do Rio de Janeiro.

Jornal: O Globo
Data: 21/09/2010
Caderno: Primeiro Caderno
Seção: Opinião
Autor: Benito Paret
Página: 7

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