Introdução
É fascinante a trajetória acelerada da produção da informação e sua proteção nas áreas de Saúde, Educação e Negócios.
Desde a invenção da língua falada para transmitir informações mantendo tradições e perpetuando aprendizados até a invenção da escrita para disseminar e comercializar documentos, as estratégias pensadas tinham o objetivo de dar maior valor à informação. É interessante relembrar as estratégias anteriores e delas extrair lições úteis para a atualidade.
No passado remoto, a introdução das vogais suavizou a fala para facilitar a memorização. Hoje, nomes de domínio e perfis de pessoas traduzem números e algoritmos que regem a vida informatizada e permitem conhecer a vida dessas pessoas, saber o que pensam, suas expectativas e até um pouco de sua experiência profissional e pessoal. Converter informação em padrão fácil de assimilar no uso pelo computador e na leitura ou visualização pelas pessoas é chave.
Também os desenhos em paredes de cavernas, mantiveram o registro do que havia naquela época. Atualmente, as imagens rupestres foram substituídas por imagens cibernéticas onipresentes e quase sempre eternas. Até mesmo o modo de enxergar mudou, com os óculos de realidade virtual e os hologramas. Como “uma imagem vale mais do que mil palavras”, sintetizar conhecimentos por meio da imagética é um exercício de imaginação e criatividade que vale a pena.
Esses dois exemplos apontam um eixo fundamental: a combinação de gestão do conhecimento (para preservá-lo e melhor utilizá-lo) com gestão da identidade (para registrar autoria ou aquisição reconhecendo investimento e propriedade/privacidade). Esse eixo potencializa o valor da informação, proporcionando inovação e vantagem competitiva.
Porém, resta uma pergunta capital: como gerir conhecimentos e identidades assegurando i) liberdade de criação, ii) aproveitamento útil da memória da informação e iii) monetização lucrativa do acervo de conhecimentos?
I – A gestão do conhecimento
Muito se fala atualmente em inovação, ferramentas cognitivas, inteligência artificial e apoio à tomada de decisão. Com a mesma intensidade, percebemos o crescimento de workshops e cursos que partem do propósito de estabelecer conexão com o cliente e extrair dele o que há de mais valioso para o negócio: seu conhecimento.
Abordagens que partem das metodologias ágeis trazem uma releitura do que há pelo menos duas décadas e meia fez parte dos estudos e pesquisas de áreas voltadas ao trabalho colaborativo, Gestão do Conhecimento e CSCW (Computer Supported Cooperative Work).
O que todas elas possuem em comum é que reconhecem a importância de explicitar o conhecimento tácito, gerar uma inteligência coletiva e de dar o significado e contexto às informações para que seja possível a partir delas chegar ao conhecimento crítico do negócio e agregar valor para o cliente e assim tornar-se a referência no segmento e gerar um diferencial competitivo.
Mas para chegar a estas informações são necessários dados. Completos, corretos, confiáveis e muitas das vezes volumosos, que acabam por compor não apenas uma base de dados ou um cubo de ferramenta de Business Intelligence mas um complexo Big Data. É a partir destes dados que se tornam viáveis análises estatísticas, avaliações de contextos similares ou mesmo previsões, como a realizada por Bill Gates (de que surgiria um vírus com disseminação global) e tão comentada no início da pandemia, ou ainda a que vem sendo proposta pelo modelo estratégico para a Saúde, conhecido como Quadruple Aim, que pretende trazer a melhoria na qualidade da Saúde populacional se pautando no acompanhamento, análises de dados, informações em seu contexto.
A Espiral do Conhecimento proposta por Nonaka e Takeuchi em 1995 já embasava a necessidade da combinação e internalização de novos conhecimentos, que seriam possíveis mediante a Socialização (transferência do conhecimento tácito de um emissor ao tácito de um receptor) ou da Externalização (conversão do conhecimento tácito em explícito). Do ponto de vista tecnológico, na sociedade atual que se intitula “Sociedade do Conhecimento”, as ferramentas colaborativas muito se desenvolveram e geraram a variedade de opções e formatos para este compartilhamento.
Até mesmo na Saúde, onde há tempos se debate a eficiência e eficácia da telessaúde, as ferramentas e PEPs começam a ganhar recursos que facilitem não apenas o armazenamento mas também a combinação, o compartilhamento e acesso, através de recursos de interoperabilidade a grandes bases de conhecimento no momento em que se fazem necessários.
Mas de posse de tanto compartilhamento, o elevado volume de dados é necessário cuidar para que não caia em “mãos erradas”, de quem pretende expor ou comercializar indevidamente estes dados. Antes mesmo de aplicar as leis e recursos de Segurança da Informação, a Organização precisa compreender que o conhecimento, embora intangível, é um ativo relevante e como tal deve ser preservado. Por ser estratégico, é necessário que os colaboradores se adaptem a uma nova cultura e adotem nova postura em sua rotina, propiciando melhor fluxo deste conhecimento dentro da organização. Para alcançar a comunicação fluida, o Planejamento e a Gestão da Comunicação são imprescindíveis para que se faça a Gestão de todo este Conhecimento. Afinal, quanto mais completo e assertivo o conhecimento durante a tomada de decisão, melhor será o direcionamento da organização. Para a Indústria, esta assertividade pode ser a diferença entre gigantes como a Google ou finais desfavoráveis como foi o da Kodak. Para a Saúde, pode ser o divisor de águas entre Instituições de excelência em seus tratamentos ou instituições onde o número de óbitos, erros e perdas se tornam mais conhecidos que os casos de sucesso.
Diferentes abordagens e técnicas abrem caminhos para que consigamos extrair o conhecimento em diferentes e mais inusitadas situações ou ramos de atividades. Por exemplo, para ambientes complexos e de alto risco como os setores da Saúde ou Segurança, existem Abordagens Cognitivas. Para trabalhar em equipes mais acostumadas ao alto nível de interação ou cujo trabalho é resultado direto da exploração e construção coletiva do conhecimento e transposta em produto ou serviço, as abordagens colaborativas são mais adequadas. Um exemplo é o próprio setor de Tecnologia, onde a cada dia mais se torna marcante o uso de metodologias ágeis.
De outro lado, organizações muito compartimentadas podem se apoiar na representação por processos e em técnicas mais centradas no conhecimento individual para promover a explicitação e construção de uma base de conhecimento coletivo.
Em suma, conhecimentos informais ou formais adquirem maior valor estratégico e econômico quando saem do tácito, individual e se tornam parte de uma Base de Conhecimento, são disseminados na organização entre as áreas e/ou papéis envolvidos. Para apoiar esta transformação, podem ser aplicadas inúmeras técnicas de Gestão do Conhecimento. No entanto, não se deve perder de vista a importância de que mesmo em meio a registros e disseminação do conhecimento, deve-se proteger a identidade e individualidade das pessoas.
II – A gestão da identidade
Como extrair valor do conhecimento sem indicação de quem é o seu proprietário e de quais licenças ele concede, ou sem identificação de quem trabalhou no seu desenvolvimento e por ele se tornou responsável, ou ainda, sem averiguar se o conhecimento embute dados que ferem direitos de terceiros e podem gerar indenizações milionárias? Por mais universal que possa ser o desejo de avançar em novas informações, técnicas e aprendizados, a gestão do conhecimento necessita da sua cara-metade, a gestão da identidade.
De fato, os sistemas de gestão de identidade (IMS, Identity Management Systems) foram concebidos para reconhecer que o rastreamento do uso individual de informações e recursos pelas pessoas é imprescindível. Sem saber o que cada um faz e cria, uma Organização fica às cegas com relação à proteção dos conhecimentos.
Por outro lado, a preocupação com Privacidade e com Proteção de Dados Pessoais está na ordem do dia, e é irreversível, no Brasil e no mundo. Gestão de identidade que não leve em conta esses aspectos poderá se converter em dor de cabeça e prejuízos, em virtude do descumprimento de deveres legais. A boa notícia é que está comprovado que as Organizações que investem nessa preparação recebem como retorno a fidelização de clientes e parceiros e a valorização da cotação de suas ações, refletindo incremento de imagem e de posicionamento de marca.
Não menos importante é a Propriedade Intelectual. Gerir identidade por equivaler a gerir autoria e a propriedade. Certos conhecimentos se qualificam como know-how proprietário. Outros podem ser protegidos por direitos autorais. Sem falar nos que traduzem inventos patenteáveis. A Organização possui uma política corporativa explícita sobre tais itens? Caso sim, ela estimula a criatividade. Caso não, ela abre a porta para a tentação de atalhos como a cópia de obras alheias. Em suma, identidade, personalidade e inventividade devem andar juntas.
Por fim, gerir identidade significa monitorar o fluxo de informações e conhecimentos. A chamada Responsabilidade Civil, que no universo jurídico consiste inclusive no dever de vigiar para não ser culpado de negligência de controle (culpa in vigilando), exige que a Segurança da Informação se dedique a mapear, inventariar e evidenciar os ativos de informação considerados relevantes. Gestão de Identidade sem segurança é o mesmo que gestão sem identidade.
Em uma palavra, Gestão de Identidade é a busca de convergência de vetores práticos e legais para fazer da Gestão de Conhecimento o motor protegido de maximização de valor do principal recurso das Organizações.
III – Conclusão
No presente, há basicamente duas atitudes possíveis em face da informação: simplesmente usá-la, ou torná-la um ativo estratégico.
A primeira é adotada pela maioria, visando utilidade pontual. A segunda é de interesse exponencial para hospitais, empresas, universidades e demais Organizações que enxerguem o valor de colocar o conhecimento no núcleo do seu modelo de negócio e construir em volta um círculo de proteções legais. Para esses, o que a história da humanidade revela sobre gestão da informação não é mero passado, é aceno presente e viável. Essa vertente merece ser investigada e explorada.
Fonte: https://www.linkedin.com/pulse/como-fazer-do-conhecimento-o-ativo-mais-valioso-athena/?trackingId=h5lG6eXVRAGIiGf6p7I%252BJw%253D%253D
Autores: Gilberto Martins e Viviane Laporti