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O evento deixou claro que o conteúdo é tão importante quanto a mídia que
possibilita sua veiculação. “O problema não é como transmitir, mas o que transmitir”, resumiu Bittar. A convergência digital, afirmaram os participantes do evento, não pode ser pensada apenas sob a ótica dos modelos de negócios e de estruturas existentes hoje – o grande desafio da legislação que está em debate no Congresso Nacional é vislumbrar outras oportunidades, como o desenvolvimento de soluções e aplicativos.
O fórum foi coordenado pelo presidente do SEPRORJ, Benito Paret, e contou com as presenças do diretor do PóloRio de Cinema e Vídeo, Cláudio Petraglia, do presidente da Riosoft, John Forman, e do representante do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), Henrique Faulhaber.
Para Benito Paret, a motivação do debate ultrapassa o interesse das empresas de informática, pois diz respeito à sociedade de um modo geral e à luta pelo fortalecimento da Tecnologia de Informação no Estado do Rio. “Em especial, nos preocupa a lei geral das teles que, na
nossa avaliação, já começou com atraso se comparada ao estágio em que as tecnologias se encontram hoje. No Brasil ainda não se valoriza o software. Estamos aqui, para dar mais um passo de um longo caminho político para mudar este quadro. Lançamos o desafio ao Governo de investir maciçamente na geração de conteúdos nacionais e no software associado, como única forma de enfrentar a desnacionalização crescente”, disse Paret.
Para John Forman, o software é o elemento que revoluciona todo o movimento da comunicação no mundo. Ele lembrou que no passado os vários formatos da programação gerada via radiodifuão, cabo, satélite, vídeo cassete e DVD convergiam para o mesmo tipo de exibição: a televisão. Hoje, além da tevê, há computadores, celulares, digital players portáteis, e consoles de jogos. “Atualmente, nos Estados Unidos, por exemplo, vendem-se mais computadores que aparelhos de TV. E aqui não vai ser muito diferente”, avaliou.
Forman lembrou que, apesar de o Brasil estar
entre os dez maiores mercados de Tecnologia de Informação do mundo, as empresas de capital nacional respondem por menos de 20% desse mercado. “O software quase ficou sem representante na questão da TV digital. É preciso criar uma legislação para ordenar este mercado”, propôs ele.
Após essa primeira rodada de discussões, as empresas se preparam para aprofundar o tema durante a Rio Info 2007, o principal evento de Tecnologia da Informação do Rio de Janeiro e um dos principais do país, que será realizado pela Riosoft – com o apoio do Sebrae, do Serpro, Apex e governos estadual e federal – entre os dias 21 e 23 de agosto, no Hotel Glória.
Três projetos discutem o assunto na Câmara
A convergência tecnológica e a produção de conteúdos por operadoras de telecomunicação, provedores de internet e radiodifusores está sendo discutida na Câmara dos Deputados por meio de três projetos em tramitação conjunta. O do deputado Paulo Bornhausen (DEM/SC),
primeiro a ser apresentado, permite às prestadoras de serviços de telecomunicação produzir, programar e distribuir conteúdo eletrônico. As empresas de telefonia fixa, por exemplo, poderiam vender serviços de televisão por assinatura, com conteúdo próprio ou de terceiros.
O segundo, do deputado Nelson Marquezelli (PTB/SP), restringe a oferta de conteúdos a empresas controladas por brasileiros, em qualquer meio, inclusive internet. O terceiro – de autoria dos deputados Paulo Teixeira (PT/SP) e Walter Pinheiro (PT/BA) – é um meio termo entre os outros: flexibiliza a prestação de serviços de comunicação, separando programação, geração de conteúdo e distribuição.
Na opinião do deputado Jorge Bittar (PT-RJ), essa profusão de projetos de lei sobre o tema “demonstra que há algo represado”, mas a discussão se arrasta, emperrada por ações judiciais movidas por empresas que se sentem prejudicadas. A licitação que seria feita pela Anatel para a implantação de serviços de
banda larga sem fio (Wi-Max) não prosperou, porque a agência criou restrições à participação das concessionárias de telefonia fixa (Oi/Telemar, Telefónica e Brasil Telecom).
Em contrapartida, a Telefónica e a TVA obtiveram licença para operar um sistema de TV por assinatura, baseada em transmissão via satélite. “É uma briga de cachorro grande e essa confusão deixa o legislador atordoado. Não se sabe o que deve ou não ser permitido”, explicou Bittar.
Mas o cerne da questão – embora ainda relegado ao segundo plano – é a discussão sobre a produção de conteúdo digital que, na avaliação de Bittar, deve ser nacional, como já reza a Constituição. “A programação deve seguir um conceito de cotas, com sub-cotas para a produção regional e de empresas independentes, como já é praticado em outros países”, defendeu o parlamentar. “Hoje a TV por assinatura vende pacotes fechados, o assinante não tem escolha”.
Conteúdo digital e tevê
pública
Um dos fundadores da TV Cultura de São Paulo e defensor da televisão pública, Cláudio Petráglia acha que a discussão sobre a geração de conteúdo digital no Brasil já nasce arcaica, porque não contempla um projeto de produção de conteúdo digital para uma nova indústria que se baseia em quatro grandes blocos: comunicação, informação, computação e entretenimento. “Este modelo de conteúdo digital, que pode ser transmitido por um canal único ou por sub-canais integrados, é muito importante, sobretudo para as tevês públicas”, argumentou.
No seu entendimento, para que toda essa discussão faça sentido, é necessário recuperar a plataforma brasileira de tevê apostando numa visão estratégica; promover a capacitação de pessoal pelas universidades, já que as empresas não investem mais na formação de mão-de-obra especializada; alterar o conceito atual de publicidade para adequá-la aos novos modelos trazidos pela Internet; e criar uma linha de financiamento do BNDES para a
produção de conteúdo digital. Feitos estes investimentos, ele acredita nos seguintes resultados:
- descentralização da cultura nacional;
- equalização da mão-de-obra especializada;
- aumento da audiência;
- equilíbrio e igualdade de condições do produto nacional e o importado em todas as mídias convergentes;
- aumento da exportação.
Mudanças nas agências reguladoras
A velocidade com que as mudanças tecnológicas provocadas pela internet acontecem é tão rápida que a legislação não consegue acompanhar. A avaliação é do representante do CGI.br, Henrique Faulhaber, que sugeriu a criação de novos marcos regulatórios que dêem conta dessas mudanças. “A lei precisa ser revista, mas também o papel das agências reguladoras, porque a Anatel e a Ancine não têm poder para regular a geração de conteúdo”.
Para Faulhaber, a internet – que no Brasil chega a apenas 20% da população – não deve ser regulada
porque precisa continuar proporcionando espaço para a inovação, diminuir barreiras de entrada e garantir o direito de expressão. Mas ele defende leis que garantam a qualidade do conteúdo e que regulamentem os maus usos da rede. “Não adianta combater os crimes praticados pela internet em apenas um país. Cerca de 80% do ‘spam’ que circula na rede vêm da China ou de Taiwan, e se propagam através do Brasil porque a rede é mal usada”, exemplificou.
Mas quando o assunto é rádio e televisão, Faulhaber defende a regulamentação, porque são meios que utilizam recursos finitos e têm importância estratégica para a implementação de políticas públicas, pois cobrem 100% do território nacional. “O conteúdo local deve ser protegido, mas é impossível criar cotas de mercado internacional. O modelo ideal deve evitar a concentração de poder de mercado nas empresas que controlam a infra-estrutura de serviços e conteúdos”, concluiu.
Fonte: Jornal OGlobo, 05/07/2007